sábado, 26 de agosto de 2017

Uma questão sobre pesadelos


Esta noite, enquanto eu dormia, sonhava com duas pessoas conversando tranquilamente. O conteúdo da conversa ou quem eram os interlocutores já me escapou da memória, mas sei que eles dialogavam sobre algo de pouca importância. Do que me lembro bem, porém, é que, num décimo de segundo, num súbito 100% inesperado de puro susto físico instintivo, um terceiro rosto, gritando com voz alta e áspera, pulou de dentro do rosto de um dos homens que conversavam em direção ao meu campo de visão, cobrindo-o por completo durante alguns instantes (algo similar ao que acontece quando, num susto barato de um filme de terror, um mostro aparece do nada e preenche toda a tela com uma asquerosidade arrepiante para a qual ainda não estávamos preparados).


Algumas diferenças entre o susto do meu sonho e o "bu!" monstruoso dos filmes de terror são notáveis: a) meu sonho não tinha, em absoluto, nenhum clima sinistro até então; b) o "monstro" não havia feito nenhuma aparição prévia no sonho, e o rosto gritando,  sendo uma espécie de espectro incorpóreo, mas visível, atravessou toda a cabeça do outro homem, ganhando forma e consistência à medida que se aproximava dos meus olhos (um tanto semelhante ao tigre saltando para fora da boca de um peixe na pintura de Dalí); e por último, mas não menos intrigante, c) meu sonho não foi dirigido pelo John Carpenter ou pelo James Wan. Quero dizer: não havia nenhum indivíduo potencialmente sádico e zombeteiro arquitetando roteiro e atores para me pregar uma peça.

A pergunta: se os sonhos são criações da nossa própria mente  "manifestações não falsificadas da atividade criativa inconsciente", como aponta Jung , o que a leva a assustar a si mesma e a fazer com que o corpo que a comporta acorde suando frio e com o coração batendo em ritmo acelerado? É possível que a mente aplique jumpscares em si mesma? Como?

Se temos mais de uma voz falando dentro de nossa cabeça, quem, realmente, somos? É possível falar em "identidade" ou em "indivíduo" quando não sabemos sequer de onde vêm nossos próprios pensamentos?


Em Hamlet, Shakespeare escreveu que "há mais mistérios entre o céu e a terra do que supõe nossa filosofia". Creio que a verdade é que existem mais mistérios entre um lado e o outro do nosso cérebro do que supõem nossa filosofia, nossa psicanálise e nossa neurociência, todas juntas.

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